Sou somente cravo

Não esperes por mim de madrugada pois não estarei lá para te ouvir.

Não esperes por mim de madrugada, nessa altura encontraras apenas o canto de uma andorinha, só verás o voo de uma cegonha, mas não me verás a mim.

Não esperes por mim de madrugada, nem tanto me procures ao teu lado.
Nessa altura de sol baixo, longe estarei eu do teu enlaço, com o espírito feliz de quem não lembra, nem recorda que julguei ser tua no dia anterior.

Não esperes por mim de madrugada, não logres pensar que somos mais que um olhar a lua e as estrelas e o por do sol antes delas.
Nunca tas poderei dar, pois não são minhas.
Por isso não esperes por mim de madrugada para te entregar coisas que não consigo apreender.

Não esperes por mim de madrugada pois tudo de mim tu já viste.
Sou somente a utopia da perfeição, eterna na sua efemeridade.
A beleza de algo inútil.
A inteligência de alguém esperto.
A sabedoria de alguém sagaz.

Não esperes por mim de madrugada, não sou aquilo que viste ou pensas-te ver.
Não me tomes por criança pensando seres tu próprio igual a mim.
Não esperes conceber-me de madrugada, pois nem as estrelas me concebem.

Sou louca sim, sou louca de madrugada.
Não me queiras rosa quando sou somente cravo.
Não tentes domar nem subestimes aquilo que nasce livre para ser.
Não sou rosa, no máximo espinho de cravo bravio.

Sou tua em qualquer altura, da melhor maneira que o consigo ser, mas não me peças que esteja á tua beira de madrugada.
Não esperes por mim de madrugada…

Não esperes algo novo, se tudo o que sou destino a mim mesma.
A madrugada passarei somente comigo,
somente porque só a mim consigo dar algo que não me pertence.
A madrugada guardo-a para me oferecer a mim própria.





(A ouvir: Zeca Afonso – Maria Faia)

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