No meu caderno de páginas brancas.
Sé
é para ser, Esquece.
Como a flor não aspira
ser árvore, eu não sonho em ser montanha.
Fico-me por aqui, com o
aquecedor ligado à beira dos meu pés.
Sabes… Nem o crepitar hipnótico do fogo da lareira me faria levantar.
(Nem iria, hoje, suportar a sua claridade nesta divisão escura)
Hoje não, que fico
aqui.
Envolvo-me em mantas
coloridas tricotadas por outras mãos, sentindo, por esse motivo, um conforto
enorme só alcançável pelo toque humano.
Pego num livro, e
noutro, e noutro.
Estou a ler quatro ao mesmo tempo… não porque são enfadonhos
ou pouco absorventes, mas porque custa entregar-me a um só para depressa virar
a ultima pagina e as palavras me abandonarem. Deixar-me sozinha com as
lembranças da narrativa, com a saudade de personagens que não voltam.
Hoje não quero ficar
sozinha.
Não iria suportar vê-las partir – às personagens – para um qualquer fim destinado pelo autor, ou
para a minha própria imaginação.
Quero-as a rodear-me, a viver a sua vida e a
deixar-me fazer parte dela. Quero ser parte dela.
Apaixonei-me por um
personagem no outro dia.
Era lindo, era culto,
era complexo.
Tinha defeitos e, por
isso, gostei mais dele. A sua parvalheira, a sua estupidez e incongruência. Era
humano, mas era homem – com tudo o de mau que isso implica.
Folheei o livro, absorvida
nos seus pensamentos, nas suas acções. Fez parte de mim.
Um dia saltou da
página, pegou-me a mão e passea-mos na praia.
Estava calor e o vento
baloiçava a sua camisa branca desabotoada como a vela de um barco, despenteava
o seu cabelo e ele sorria. Não sei do que falou. Não me lembro dos traços do
seu rosto, só do sorriso e do sol alaranjado a tocar-lhe os lábios. Eu ria também.
Quando o ponto final –
aquela horrível pontuação – surgiu sem aviso quase chorei.
Já não era meu, tinha
acabado a sua historia. O seu autor tinha-lhe permitido o seu fim.
Não me entrego a um
livro, embora o ame por completo.
Mas quero fazer parte
dele.
Quero ler e perder-me e
esquecer a prudência, quero encontrar um que tenha defeitos adoráveis e
beija-los a todos!
Mas hoje não, que quero
ficar sozinha.
Hoje o passeio na areia
é só meu,
levo antes um caderno com páginas brancas…
escrevo-te pelo caminho de
maneira a que nunca acabes.
E, quando estiveres para acabar, passo borracha e escrevo-te novamente.
(“The books we need are the kind that act upon us like a misfortune, that makes us suffer like the death of someone we love more than ourselves, that make us feel as though we were on the verge of suicide, or lost in a forest remote from all human habitation—a book should serve as the ax for the frozen sea within us.”
-- Franz Kafka in a letter to Oskar Polllack)
(“The books we need are the kind that act upon us like a misfortune, that makes us suffer like the death of someone we love more than ourselves, that make us feel as though we were on the verge of suicide, or lost in a forest remote from all human habitation—a book should serve as the ax for the frozen sea within us.”
-- Franz Kafka in a letter to Oskar Polllack)
Comentários
Enviar um comentário